mardi 10 juin 2008

Chico Mendes, crime, castigo, Zuenir e eu!

Há fases em que estamos mais propensos às leituras, outras à escrita, assim como momentos nos quais se anseia ser lido ou ouvido, em oposição a outros quando queremos apenas nos entregar aos encantos alheios. E no meio disso, existe, também, aqueles dias em que se tem vontade de tudo, ainda que não se faça nada.
Nos últimos tempos tenho me dedicado à absorção de conhecimento, mais do que ao seu repasse. Resisti ao intuito de escrever, ainda que meus dedos coçassem, para não me desgastar com auto-críticas inúteis. Fiz milhares de textos mentais, sem escrever uma linha no papel ou digitar palavras em arquivos brancos do Word. Mas é impossível fugir para sempre. Meu bloguitcho clama por atualizações (apesar da falta de legentes). Então, cá estou para satisfazer meus anseios vãos e, quem sabe, com a ajuda de Zuenir Ventura, descolar algum novo leitor perdido nesta selva virtual.



A primeira vez em que coloquei meus olhos sobre o livro Chico Mendez: crime e castigo de Zuenir Ventura, ainda na homepage da Companhia das letras, pensei:
Embora este volume faça parte da minha coleção favorita (Jornalismo Literário) tenho medo dele. Estes assuntos factuais, que todos deveríamos saber, me fazem sentir ignorante demais e quase sempre são um pouco desgastantes, exigem concentração e dedicação em demasia.
Bastou, no entanto, ler a primeira página da obra para meus temores se dissiparem. Afinal, com um início como o que se segue, não há como não se encantar.

“No dia em que Chico Mendes ia morrer, 22 de dezembro de 1988, Ilzamar Mendes queria assistir à morte de Odete Roitman. Durante aqueles últimos oito meses, o Brasil parava às 8h30 da noite – 6h30 no Acre – para se revoltar com as maldades da megera sem escrúpulos e sem caráter que se transformara no símbolo de um país que terminava o ano com 900% de inflação, o naufrágio do Bateau Mouche e uma sensação de impunidade generalizada – um país do Vale Tudo, como sugeria o título da novela da TV Globo de que Odete era a vilã.
Se soubesse que a morte anunciada para aquela noite só iria ocorrer na verdade dois dias depois, quase na hora da ceia de Natal, Ilzamar não se apressaria tanto em interromper o jogo de dominó entre o marido Chico Mendes e os seus seguranças, o cabo Roldão e o Soldado Lucas” (pág. 15).


Assim fica fácil perceber a razão pela qual Zuenir fora contemplado com um Prêmio Esso de Jornalismo por essa reportagem, não? E no fim, como a obra é toda dividida em capítulos pequenos: com as matérias redigidas na época; diário de viagem e a seqüência de reportagens 15 anos depois, relatando a conclusão do caso do assassinato do líder seringueiro Chico Mendes. Você acaba nem percebendo as horas que passou compenetrada na leitura. E, o melhor de tudo, sem a menor chance de se perder entre os fatos históricos. Ao contrário, você se diverte com a forma como ele conduz os relatos, como no trecho em que descreve a boa fama com mulheres e a virilidade do mandante do crime, então com 54 anos e 5 esposas, Darly Alvez da Silva:

“Baixo, esquelético, feio, cego de um olho, dentes ruins, uma úlcera e mau hálito, Darly aparentemente não ostenta qualquer atrativo físico. Aparentemente. Na realidade, todas as suas mulheres encontraram nessa inesperada síntese de Tanatos e Eros encobertos encantos para alimentar um irresistível fascínio” (pág. 153).

Ou ainda, com as anotações do seu diário, quando expõe as situações inusitadas pelas quais passou durante a reportagem.

"Diálogo com seu Aécio Silva, que seria o dono de um barco para alugar:

- O senhor teria um barco com motor para me levar com urgência ao seringal Nova Esperança?
- Teria.
- Que bom! Quanto custa?
- Mas eu não tenho, eu vendi o meu barco ontem.
- Mas o senhor disse que tinha!
- o senhor num perguntou se eu tinha, perguntou se eu teria. Eu disse que teria, num tenho.
Me senti em Portugal" (pág. 113).


Com certeza esse livro vale cada segundo da nossa atenção. Portanto, leiam-no!

Ilustração: Bebel Callage

2 commentaires:

Maitê Mendonça a dit…

Esse livro Ingrid é o favorito de outo amigo meu. Todo mundo que lê adora. Mas eu ainda não consigo ler nem os teóricos que sou obrigada. Bjos

Anonyme a dit…

Como havia, dito gostei da tua forma de expressão nos textos. Já ouvi falar muito do Zuenir, mas confesso que não tenho "paciência" para esse tipo de leitura... Sugiro como próxima pauta para o teu blog, uma matéria sobre a tua futura especialidade: moda x guerra! Beijos!